O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) concedeu liminar para um motorista de Campinas (SP) atuar no transporte de passageiros com o aplicativo Uber. Com a decisão do desembargador Relator Fermino Magnani Filho, da 5ª Câmara de Direito Público, a Secretaria de Transportes fica impedida de medidas restritivas que o impossibilitem o livre exercício da atividade.
“Queria deixar claro que não sou pró-Uber. Sou pró-democracia e livre exercício da atividade econômica”, ressalta o motorista e proprietário de carros de transporte executivo Jorge Akira de Araújo Caldas.
Os motoristas de Uber entraram no mercado de Campinas no final de janeiro. Desde lá, 19 veículos foram apreendidos pela Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec). Destes, nem todos utilizavam Uber.
O órgão se baseia em lei municipal que considera regular o transporte individual de pessoas apenas por taxistas regulamentados na cidade. Campinas tem cerca de 900 táxis entre convencionais, executivos e acessíveis.
Procurada pelo G1, a Emdec informou que está tomando conhecimento da decisão do tribunal para definir o que fará. A ação foi impetrada contra o secretário dos Transportes, Carlos José Barreiro.
“A Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas (Emdec) irá tomar ciência do inteiro teor da liminar para poder se pronunciar e tomar as medidas jurídicas cabíveis.Cabe ressaltar que a Emdec é cumpridora de todas as decisões judiciais“, diz nota enviada ao G1.
Novo cotidiano
Na decisão, o desembargador afirma que o serviço faz parte do novo cotidiano dos cidadãos e que cabe ao Poder Público fiscalizar as condições dos automóveis, lei de trânsito e segurança de todos.
“ É notória a polêmica instalada nos últimos meses, não só nas principais capitais brasileiras como noutros países, sobre a novidade e consequências do advento do aplicativo Uber. Serviço que surge como alternativa à atividade taxista, porém no limbo da regulamentação usual das prefeituras. Novidade que como outras aturde, não havia planos em lugar algum; metrópoles estrangeiras também tatearam nesse moderno “conflito de classes”. Há inequivocamente, de parte dos antagonistas, motoristas de táxis “tradicionais”, pretensões monopolistas, temor à concorrência, o repúdio ao convívio com esse novo serviço, movimentos paredistas em vias públicas (em prejuízo da normalidade urbana). E no extremo, violências físicas rotineiramente publicadas na imprensa. O que de fato ocorre é apenas reflexo da inserção dos meios eletrônicos na vida cotidiana, o que não raro aturde, abala convicções antigas e atiça o ímpeto regulatório”.
O desembarbador diz ainda: “Telefones celulares, para focarmos o exemplo mais óbvio, ultrapassaram a noção elementar da mera comunicação, prestam-nos inestimáveis confortos instantâneos, possibilitam chamadas de longa distância a custo baixíssimo (governos e empresas telefônicas já sentem o prejuízo na boca do caixa). São, como o Uber, derivações múltiplas do e-commerce que, no caso dos autos, esbarra nos preceitos constitucionais sobre a liberdade econômica.”.
A decisão ainda cita como deve ser a fiscalização. ” Ressalto como premissa, que a fiscalização das Prefeituras sobre a frota circulante e os transportes públicos em particular, neles incluído o serviço (autorizado ou dito clandestino) de táxis, é necessária e está constitucionalmente legitimada em proveito da segurança comum, cidadãos e usuários desses veículos; deve existir e está autorizada, seria um contrassenso coibi-la. Mas essa vigilância deve restringir-se à análise das condições de conservação e de segurança do veículo, sua regularidade documental, aplicação das leis de trânsito, coibição de embriaguez ao volante etc”.
O desembargador Relator Fermino Magnani Filho diz ainda sobre apreensão de veículos. “A Administração não pode apreender veículos, como diariamente noticiado, apenas por que tais motoristas não são considerados “oficialmente” taxistas num campo, ao que parece, ainda não convenientemente regulamentado da atividade econômica eletrônica. Agir de modo contrário impediria, num exame perfunctório, o exercício da liberdade constitucional de empreendedorismo privado. Debate desafiante a ser melhor estruturado no julgamento do mérito da demanda”, relata o desembargador.
Precedente
A decisão do TJ pode abrir precedente para outros motoristas realizarem corridas de clientes que acionam o veículo pelo aplicativo Uber.
“Acredito que os próximos motoristas e as próximas pessoas que tentarem entrar talvez consigam também. Não é justo deixar todo o transporte, que falam que é privado, só com uma categoria. É monopólio. Não pode beneficiar A ou B”, completa Akira.
O advogado dele, Danilo Godoy Andrietta, disse acreditar que a liminar conseguida no TJ possa abrir precedente para ações do Uber ou coletivas. “Abre um precedente importantíssimo. Uma jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo especificamente em relação à legislação de Campinas [Lei Municipal 13.775 de 2010], que considera clandestino todo o transporte privado que concorra aos táxis”, explica o defensor.
Andrietta afirma que a lei municipal fere a Constituição Federal no que se refere a livre concorrência e a livre iniciativa.
Lei deve ser respeitada
“Essa liminar não é nada e pode ser cassada. Foi dada de forma monocrática. Tem lei municipal e federal dos taxistas. O governo precisa cumprir a lei”, declara o presidente do Sindicato dos Taxistas Permissionários Autônomos do Município de Campinas (Sinditáxi), Jorge Pansani de França.
França disse ao G1 que a categoria se reuniu nesta manhã para discutir a liminar concedida pelo TJ. Segundo o dirigente sindical, a primeira decisão tomada é que foi descartada a hipótese de greve da categoria.
“ A população não pode ser punida”, afirma.
O taxista disse ainda que será solicitada para a Secretaria de Transportes cassar a liminar.
Fonte: G1